segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Espumantes Ingleses? Que novidade!

Em plena Vinitaly, um convite tentador: uma degustação comparativa entre espumantes italianos e... ingleses! Essa não dá para perder, então adio algumas visitas e vamos lá.


A degustação foi preparada pela jornalista Italiana Michèle Shah, escritora, promotora de eventos e colunista em revistas internacionais, especializada no vinho italiano.
Michèle pesquisou a região e os produtos e criou essa oportunidade única, uma das degustações programadas da Vinitaly, que motivou uma grande platéia onde ninguém havia degustado os espumantes ingleses antes.

SOBRE A REGIÃO
No passado já se tentou fazer vinho na Inglaterra, os romanos ali implantaram vinhedos há 2000 anos! A região é bem ao sul da ilha, e seu clima frio e chuvoso se mostrou obviamente inadequado.
Com as mudanças recentes de temperatura, o sul da Inglaterra mostra hoje similaridades com o norte da França, e se iniciou uma produção local de espumantes, que hoje já se mostra amadurecida, mas tem muito caminho pela frente até concorrer com os espumantes e de países com tradição nessa fascinante bebida.

A PRODUÇÃO
Atualmente (2012) existem 1.800 hectares de vinhedos, cultivados com as variedades Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier. A produção atual é de 3 milhões de garrafas, devendo chegar a 5 milhões em 2015. O maior consumo é do mercado inglês, com principais importadores na Escandinávia e Oriente.

A DEGUSTAÇÃO
Foram degustados ao todo 12 espumantes, 3 italianos do Trento, 3 italianos de Franciacorta (Lombardia) e 6 ingleses.
Villa Crespia Franciacorta Numero Zero – Fratelli Muratori
Cremoso, mineral, seco, longo e envolvente, com frutas maduras e notas de pedra morena.
Glasbond Estate Blanc des Blancs 2007 Chardonnay
Em sua segunda safra de produção, é quase dourado, mostra maçã madura e desidratada, leveduras frescas e saborosas, final frutado gordo muito bom. A acidez é alta (8,3) o que explica a dosagem mais alta para equilibrar, mas o resultado é um pouquinho enjoativo, ficando ainda um final sápido.
Ferrari Trento DOC
Aroma maduro, gordo, de frutas e leveduras. Boca enxuta, com fruta quase passada, leve nota mineral (das montanhas). Final longo e saboroso com médio frescor. Complexo, fresco e convidativo. Devido ao aquecimento, a vinícola está plantando novos vinhedos em locais mais altos para manter as características do terroir.
Guido Berlucchi Franciacorta Cellarius Pas dosé 2006
Frutas carnudas (pêssego, damasco), frescor equilibrado, média complexidade, notas picantes, evolução muito fina, longo e agradável.
Chapel Down Pinot Noir / Chardonnay 2006
Aroma elegante de frutas brancas e notas florais. Acidez média, base de leveduras, sabor evoluído com frutas passadas e nota salina, final com leve toque picante de pimenta branca. Acidez alta (8,5) e dosagem potente (12g). Um pouco pesado e enjoativo na conjunção fruta passada / dosagem.
Denbee Estate English Sparkling Brut 2007
Pinot Noir 50%, Chardonnay 35%, Pinot Meunier 15%
Aroma de leveduras tostadas e notas vegetais. Evolui fresco, com notas vegetais, tostados, leve amargor. Muito dosado (13 g), para equilibrar os sabores vegetais provavelmente devidos a maturação incompleta das uvas. A vinícola está trabalhando em melhorias nos vinhedos.
Balfour Brut Rosé 2008
Cor rosa-castanho leve. Aroma estranho de queijo gorgonzola, provavelmente de fermentação malolática ocorrida após engarrafado, fruto de inexperiência. Muito ácido, é gordo, com boa estrutura, evolui com amargor e frutas vermelhas desidratadas.
Bridge View Pinot Noir / Pinot Meunier
Aroma de leveduras maduras. Boca potente, estrutura de uvas tintas, acidez volumosa. Frutas dominantes, sutil levedura, final com leve amargor, pode cansar. O estilo sugere prensagem excessiva das uvas.
Maso Martis 2006 - Trento – Pinot Noir 70% Chardonnay 30%
Boa safra. Pinot Noir sem malolática, Chardonnay fermentado e maturado em barrica (6 meses), com malolática. Elegante, macio, amplo e generoso, frutas intensas, leveduras elegantes, final cremoso e envolvente. Muito bom.
Balny Cuvée Rosé 2009 Pinot Noir
Aroma fino e elegante. Na boca é equilibrado, com acidez gorda, jovial e fresco, algo dosado (10 g/l). Final com leve amargor, elegante. Bem bom.
Altemasi Riserva Agrate 2004 – Trento – Chardonnay 70% Pinot Noir 30%
60 meses de autólise. O ataque é fresco, evolui com levedura bonita e frutas brancas maduras e pão branco. Nota mineral, corpo gordo, final longo de fruta com amargor e leve sapidez.
Cà del Bosco Franciacorta 2004 – Chardonnay 55% Pinot Bianco 25% Pinot Noir 20%
Fruta ampla, boa acidez, nota mineral. Evolui bonito, muito gastronômico, final de fruta branca sólida com pedra mineral

CONCLUSÕES
Os espumantes italianos, como esperado, mostraram maturidade, qualidade e finesse.
Os espumantes ingleses, devido ao recente início de produção, apresentam diversas inconsistências e desequilíbrios, além de alguns problemas.
A maioria mostra níveis altos de dosagem (teor de açúcar resultante do licor de expedição), usado para equilibrar a acidez elevada produzida pelas uvas (característica do terroir), o que aponta para ajustes no manejo dos vinhedos. A presença de notas de imaturidade nas uvas revela a dificuldade de completar a maturação fenólica das cascas, o que é um problema grave de comportamento do clima local. Surgem ainda notas salinas, típicas dos vinhedos próximos ao litoral, detalhe que deverá ser equacionado, por ser imutável.
Como disse a Baronesa Philipinne de Rothschild sobre a vinicultura, “Wine making is really quite a simple business. Only the first 200 years are difficult.”

CARLOS ARRUDA- academia do vinho

Nenhum comentário:

Postar um comentário