segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Do sul da França, caráter


Google Imagens


Durante muito tempo, o sul da França ficou conhecido por seu Vin de Pays d'Oc, vinho de denominação regional, confiável e prazeroso, mesmo sendo simples.

A região é um verdadeiro Eldorado vinícola. No Rhône meridional há várias AOC (Appellation d'Origine Controlée), onde encontramos brancos e tintos de caráter jovem e fresco de vinhedos mais altos, como Côtes du Luberon, Côtes du Ventoux e Côteaux du Tricastin.

Na zona do Languedoc, solos xistosos se entremeiam com calcários e arenitos, dando uma paleta incrível de "terroirs" - alguns costeiros e calorosos, alguns sobre as montanhas, mais frescos. Todas as uvas mediterrâneas são usadas (mourvèdre, syrah, grenache e carignan, entre outras), mas a porcentagem de syrah aumenta.

Languedoc produz tintos firmes e produtores independentes se aglomeram na região. Em Faugères, sobre puro xisto, há vinhos firmes, densos e terrosos.

Os vinhos das AOC St-Chinian, dos xistos, ao norte, é exuberantemente frutado, mais denso e longevo nos vinhedos da faixa calcária ao sul.

Em Minervois o arenito domina, e seus vinhos são cada vez mais sérios. Corbières tem vários microclimas e grande potencial para vinhos ricos, carregados de calor e apimentados.
A AOC Fitou, a mais antiga, de 1948, é beneficiada pelas expressões da uva grenache na parte mais montanhosa e da syrah com mourvèdre no lado marítimo.

Os vinhos são para quem tem um espírito Indiana Jones. A recompensa é enorme. São cheios de calor, aromas de ervas, toques vermutados e costumam ter ótimos preços.
J.L Colombo La Violette Viogner (Vin de Pays d'Oc)
Aroma de erva-doce e mel. Boa estrutura, mas simples

Vignerons du Mont Ventoux 2010 (Côtes du Ventoux)
Aroma de toffee e fruta cozida. Taninos firmes, mas leve, bom para comida

Ch. Du Donjon G.Tradition 2010 (Minervois)
Perfumadíssimo. Licor de jaboticaba e incenso. Frutado, rico, final lembra café

Domaine du Ministre 2006 (St.Chinian)
Ameixa preta, tabaco, flor, anis. Bem encorpado, vigoroso

Por Alexandra Corvo

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Côt ou Malbec?


Malbec


Nenhum dos dois...ou os dois. Tanto faz, são dois nomes da mesma uva. Quando pergunto para meus alunos aqui na escola de onde vem a malbec eles não hesitam: Argentina.
Mas a história é bem outra.

A uva tem origem no sudoeste da França. Até a crise da filoxera (pulgão que dizimou vinhedos no mundo todo no final do século 19) chegar na região de Bordeaux, a malbec representava maior parte do vinhedo plantado.
Com o replantio, adaptou-se mal aos porta-enxertos da época e foi substituída na liderança pela Merlot.

Hoje, na França, aparece em corte em várias denominações do sudoeste, mas sua expressão mais interessante é em Cahors, onde seu uso é obrigatório em 70% dos vinhos.
Ali também é conhecida como auxerrois.

É capaz de gerar aromas de pimenta-do-reino, couro, frutas pretas e, nos melhores casos, flores secas. Em boca, são vinhos muito densos com uma estrutura de taninos mais marcados e firmes.

Bem diferente de sua terra de adoção contemporânea, a Argentina.
Aqui, no país vizinho, os vinhos feitos com a malbec são muito exuberantes, com notas de frutas vermelhas em geleia, violeta e notas achocolatadas. Costumam ter bom corpo, mas com taninos menos evidentes. São vinhos mais cremosos.

O que explica a identificação da malbec com a Argentina é que seu nome aparece no rótulo, evidenciando-a como principal elemento de sabor. Na França isso é incomum.
A filosofia é que a origem do vinho é que lhe dá o caráter e não apenas a uva. Diz-se: você não está tomando um malbec, está tomando um Cahors.

Vale a pena prová-los comparando para ver como a uva não é tão determinante, já que muda radicalmente quando se muda de ambiente. Nenhum é melhor. São apenas diferentes.
Luigi Bosca DOC Malbec 2009
Geleia de jaboticaba e chocolate. Boca cheia, ampla e macia

Château Pineraie 2008
Notas de vermute, folhas secas. Bem tânico e perfumado

Caitec Malbec 2009
Simples, com notas de cereja, fácil e refrescante

Por Alexandra Corvo

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Circunflexo Invertido


Vinho é geografia. Não que se precise saber as capitais, os pontos cardeais e o índice demográfico dos países, como era a decoreba escolar. Mas, em caso de pânico, basta abrir o mapa e muitas respostas estarão lá. Usei o método quando fui provar os vinhos da Eslovênia (e da Croácia, que estarão na próxima coluna). Pensei: o carvalho esloveno tem sido bem elogiado e utilizado no mundo. Inúmeros produtores estão trocando os tonéis de carvalho americano pelo esloveno. E ponto.

Divulgação
Sauvignon Blanc, Rebula e Pinot Noir

Acabava nessa frase minha sabedoria sobre a região. Abri o mapa: bingo! Eis o país encostado nos Alpes, fazendo fronteira com Itália e Áustria, dividindo climas com parte da planície da Panônia e sob influência do gigantesco espelho d’água que é o Lago Neusiedler, onde fica o Burgenland (de onde saem bons tintos e os espetaculares botritizados austríacos, como os do Weingut Kracher). No caso dos vinhos provados, da região de Goriska Brda, as brisas mornas do Adriático e o estilo friulano, vizinho, são decisivos.
Também é importante para sua climatologia a faixa de fronteira que compartilha com a Styria, a chamada Toscana da Áustria. A Styria é famosa pelos Sauvignons Blancs elegantes, minerais e sóbrios (e pelo uso de madeira nesses vinhos, coisas do vinhateiro doidão Manfred Tement). Ou seja, nada de erudição estéril: a leitura do atlas diz o que esperar dos vinhos. Tudo resolvido via mapa. O Atlas Mundial do Vinho é o GPS do bebedor interessado.
Os três únicos produtos eslovenos disponíveis no Brasil até agora são da Simcic (tem um acento circunflexo invertido sobre os "cês" que não consegui reproduzir), o que limita a avaliação dos vinhos eslovenos ao extremo sudoeste do país. Mas a promessa é boa. E qual o Simcic de que mais gostei? Justamente um Sauvignon que passa por carvalho (tonéis de 500 litros).

* * * * Sauvignon Blanc Selekcija 2008
Simcic
Contido e sério no nariz, tem aroma verdoso e um pouco de sílex. Na boca é equilibrado, ótimo corpo, denso, elegante e surpreendente na sua mineralidade


* * * Pinot Noir 2008
Simcic
Tem tipicidade da casta, é delicado, mas com taninos um pouco marcados. Acidez perfeita. Muito fino

* * * Rebula 2009
Simcic
Nariz picante e muito cítrico, de grapefruit, casca seca. Boca muito fresca, ótima acidez, abre a sede

Por Luiz Horta




segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Espumantes Ingleses? Que novidade!

Em plena Vinitaly, um convite tentador: uma degustação comparativa entre espumantes italianos e... ingleses! Essa não dá para perder, então adio algumas visitas e vamos lá.


A degustação foi preparada pela jornalista Italiana Michèle Shah, escritora, promotora de eventos e colunista em revistas internacionais, especializada no vinho italiano.
Michèle pesquisou a região e os produtos e criou essa oportunidade única, uma das degustações programadas da Vinitaly, que motivou uma grande platéia onde ninguém havia degustado os espumantes ingleses antes.

SOBRE A REGIÃO
No passado já se tentou fazer vinho na Inglaterra, os romanos ali implantaram vinhedos há 2000 anos! A região é bem ao sul da ilha, e seu clima frio e chuvoso se mostrou obviamente inadequado.
Com as mudanças recentes de temperatura, o sul da Inglaterra mostra hoje similaridades com o norte da França, e se iniciou uma produção local de espumantes, que hoje já se mostra amadurecida, mas tem muito caminho pela frente até concorrer com os espumantes e de países com tradição nessa fascinante bebida.

A PRODUÇÃO
Atualmente (2012) existem 1.800 hectares de vinhedos, cultivados com as variedades Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier. A produção atual é de 3 milhões de garrafas, devendo chegar a 5 milhões em 2015. O maior consumo é do mercado inglês, com principais importadores na Escandinávia e Oriente.

A DEGUSTAÇÃO
Foram degustados ao todo 12 espumantes, 3 italianos do Trento, 3 italianos de Franciacorta (Lombardia) e 6 ingleses.
Villa Crespia Franciacorta Numero Zero – Fratelli Muratori
Cremoso, mineral, seco, longo e envolvente, com frutas maduras e notas de pedra morena.
Glasbond Estate Blanc des Blancs 2007 Chardonnay
Em sua segunda safra de produção, é quase dourado, mostra maçã madura e desidratada, leveduras frescas e saborosas, final frutado gordo muito bom. A acidez é alta (8,3) o que explica a dosagem mais alta para equilibrar, mas o resultado é um pouquinho enjoativo, ficando ainda um final sápido.
Ferrari Trento DOC
Aroma maduro, gordo, de frutas e leveduras. Boca enxuta, com fruta quase passada, leve nota mineral (das montanhas). Final longo e saboroso com médio frescor. Complexo, fresco e convidativo. Devido ao aquecimento, a vinícola está plantando novos vinhedos em locais mais altos para manter as características do terroir.
Guido Berlucchi Franciacorta Cellarius Pas dosé 2006
Frutas carnudas (pêssego, damasco), frescor equilibrado, média complexidade, notas picantes, evolução muito fina, longo e agradável.
Chapel Down Pinot Noir / Chardonnay 2006
Aroma elegante de frutas brancas e notas florais. Acidez média, base de leveduras, sabor evoluído com frutas passadas e nota salina, final com leve toque picante de pimenta branca. Acidez alta (8,5) e dosagem potente (12g). Um pouco pesado e enjoativo na conjunção fruta passada / dosagem.
Denbee Estate English Sparkling Brut 2007
Pinot Noir 50%, Chardonnay 35%, Pinot Meunier 15%
Aroma de leveduras tostadas e notas vegetais. Evolui fresco, com notas vegetais, tostados, leve amargor. Muito dosado (13 g), para equilibrar os sabores vegetais provavelmente devidos a maturação incompleta das uvas. A vinícola está trabalhando em melhorias nos vinhedos.
Balfour Brut Rosé 2008
Cor rosa-castanho leve. Aroma estranho de queijo gorgonzola, provavelmente de fermentação malolática ocorrida após engarrafado, fruto de inexperiência. Muito ácido, é gordo, com boa estrutura, evolui com amargor e frutas vermelhas desidratadas.
Bridge View Pinot Noir / Pinot Meunier
Aroma de leveduras maduras. Boca potente, estrutura de uvas tintas, acidez volumosa. Frutas dominantes, sutil levedura, final com leve amargor, pode cansar. O estilo sugere prensagem excessiva das uvas.
Maso Martis 2006 - Trento – Pinot Noir 70% Chardonnay 30%
Boa safra. Pinot Noir sem malolática, Chardonnay fermentado e maturado em barrica (6 meses), com malolática. Elegante, macio, amplo e generoso, frutas intensas, leveduras elegantes, final cremoso e envolvente. Muito bom.
Balny Cuvée Rosé 2009 Pinot Noir
Aroma fino e elegante. Na boca é equilibrado, com acidez gorda, jovial e fresco, algo dosado (10 g/l). Final com leve amargor, elegante. Bem bom.
Altemasi Riserva Agrate 2004 – Trento – Chardonnay 70% Pinot Noir 30%
60 meses de autólise. O ataque é fresco, evolui com levedura bonita e frutas brancas maduras e pão branco. Nota mineral, corpo gordo, final longo de fruta com amargor e leve sapidez.
Cà del Bosco Franciacorta 2004 – Chardonnay 55% Pinot Bianco 25% Pinot Noir 20%
Fruta ampla, boa acidez, nota mineral. Evolui bonito, muito gastronômico, final de fruta branca sólida com pedra mineral

CONCLUSÕES
Os espumantes italianos, como esperado, mostraram maturidade, qualidade e finesse.
Os espumantes ingleses, devido ao recente início de produção, apresentam diversas inconsistências e desequilíbrios, além de alguns problemas.
A maioria mostra níveis altos de dosagem (teor de açúcar resultante do licor de expedição), usado para equilibrar a acidez elevada produzida pelas uvas (característica do terroir), o que aponta para ajustes no manejo dos vinhedos. A presença de notas de imaturidade nas uvas revela a dificuldade de completar a maturação fenólica das cascas, o que é um problema grave de comportamento do clima local. Surgem ainda notas salinas, típicas dos vinhedos próximos ao litoral, detalhe que deverá ser equacionado, por ser imutável.
Como disse a Baronesa Philipinne de Rothschild sobre a vinicultura, “Wine making is really quite a simple business. Only the first 200 years are difficult.”

CARLOS ARRUDA- academia do vinho

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Nova Zelândia se inspira na França para produzir ótimos vinhos


A uva Pinot Noir é, entre as tintas, o ícone da Nova Zelândia. Variedade caprichosa que raramente se adapta muito bem a outras regiões fora da Europa, especialmente da Borgonha, seu terroir de origem, encontrou no país da Oceania clima e solo perfeitos. A vinícola Schubert, instalada em Martinborough, no Sul da Ilha Norte, e a menor das áreas vinícolas neozelandesas, é uma marca em ascensão e tem três rótulos diferentes produzidos com esta casta (entre R$ 128 e R$ 248). Na hora de escolher as videiras para povoar os seus campos, plantados a partir do final dos anos 1990, Kai Schubert, dono da empresa, foi meticuloso: escolheu um clone de Pommard e outro de Dijon, duas áreas distintas da Borgonha, que produzem vinhos igualmente diferentes, ainda que com a mesma uva. 

— O clone de Dijon tem mais músculos e taninos. É masculino. Enquanto o de Pommard apresenta mais fruta, frescor e elegância. É mais delicado e feminino — diz Kai. 

Não falta personalidade aos vinhos da Nova Zelândia. Neste caso, e em muitos outros, o caráter é nítida e assumidamente francês. Importados pela World Wine (2422-4614), que acaba de inaugurar um quiosque no Fashion Mall, os rótulos dessa vinícola são inspirados em certas regiões francesas. O Sauvignon Blanc (R$ 108), por exemplo, segue a linhagem do Loire, enquanto o monumental Syrah (R$ 248) tem a concentração, a força, a delicadeza e a explosão de frutas que caracterizam os melhores vinhos do Rhône Norte. 

— A brisa do oceano refresca os vinhedos, que assim ganham grande expressão de aromas, ao mesmo tempo em que preservam a boa acidez, enquanto o clima seco do verão, com dias quentes e noites frias, favorece o amadurecimento, com características climáticas próximas da Europa — explica Kai. — Isso numa área relativamente pequena, com diferentes topografias, o que permite diversos microclimas, e naturalmente vinhos diferentes. 

A França é quase sempre fonte de inspiração para os enólogos. Outro nome de destaque da enologia neozelandesa, a Craggy Range, da Decanter (www.decanter.com.br), acaba de firmar uma parceria com a Compagnie Vinicole Baron Edmond de Rothschild, uma das mais famosas da França. O flerte com o país já acontece há tempos. Entre os vinhos, há um Chardonnay no estilo Mersault e outro inspirado em Chablis. E os Pinot Noir também se espelham na Borgonha, em suas várias vertentes, enquanto há cortes que parecem Bordeaux e rótulos de Syrah com a cara do Rhône Norte.

Por BRUNO AGOSTINI




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